De acordo com a matéria, o mundo jornalístico, aparentemente, estava “horrorizado” com o fato de ela ter aparecido em público com a barriga
de pós-parto em uma roupa que a evidenciava. Como se pela primeira vez na
história da humanidade uma mulher tivesse saído da maternidade com a barriga grande!!!
Ainda nesta matéria, foi dito que a Duquesa rompeu com um
padrão de beleza exigido por uma mídia que ganha muito dinheiro com os anúncios
dos produtos de beleza, e que por isso, está sempre ao dispor dessa indústria
criando ideais de beleza inatingíveis, a fim de mantê-la sempre com um volume
absurdo de consumidoras ávidas pela tal beleza prometida nos cosméticos. E
finalizou convocando as mulheres a se rebelarem contra este padrão midiático e
machista que enfraquece a mulher politicamente, uma vez que ela fica feito
louca tentando ser bonita em vez de ser politicamente ativa.
Li a matéria e fiquei pensando sobre o assunto... Concluí
que existe algo por trás dessa bola de neve da beleza, que vai muito além de
uma mídia forte o suficiente para convencer multidões e desarticular as
mulheres de seu poder político na sociedade. Há algo que falta a essas
multidões e que a mídia, com suas promessas de obtenção de uma beleza fácil e
rápida, capturam-nas facilmente. Acredito que tudo que se propõe ser rápido e
fácil levanta dúvidas e suspeitas. Tanto faz se isso é proposto por mídia,
ciência, religião ou qualquer outro detentor de suposto saber.
Acho que existe algo que falta aos homens, e não acho isso somente
por ser psicóloga, mas por ser gente, antes de qualquer coisa. O ser humano é
isca fácil desse tipo de armadilha porque está sempre em busca de algo que
tampone este vazio existencial. Cria-se a ilusão de que se esta demanda por
parte do mundo de ser magro, inteligente, rico, branco, etc for respondida à
altura, então aquele que respondeu à demanda do mundo será premiado com amor. E
em troca disse amor, perde-se a dimensão do que realmente se deseja, perde a
dimensão de si mesmo!
Toda pessoa precisa ter marra para conseguir segurar a onda
de ser quem é, mas também precisa de muita análise para perceber que sempre
haverá um buraco dentro de si (e aqui leia-se: em cada um de nós!), incapaz de ser
preenchido por mais que se desdobre para ser de uma maneira X, Y ou Z. Esse
vazio é inerente à existência do ser humano, e não há cosmético, nem emprego,
nem filho, nem droga (ilícita ou lícita), nem marido, nem comida, nem mãe, ou amigo, enfim, nada nem ninguém que possa tapar
esse buraco! Faz parte da vida essa falta... E assumir isso dói e custa muitíssimo
até que se aceite meramente essa verdade!
Entretanto, muitas pessoas acreditam que se fossem amadas,
tapariam este buraco existencial doloroso... E em nome disso, se submetem a
tudo e a todos, sem nem por um segundo se perguntarem se isso faz parte de seu
desejo. Movidas, simplesmente, pelo medo de serem odiadas ou de perderem o amor
de alguém.
Vim de uma família de muitas mulheres... Mulheres de vários
tipos (físicos e de mentalidade), e isso me fez sempre refletir muito sobre “ser
mulher”, pois cada uma, com seus pensamentos sobre a vida, iam me impondo sua
própria maneira de ser mulher, seja uma maneira mais revolucionária (não
aceitando o machismo e as grandes barreiras contra a mulher), ou sendo de uma
maneira mais conservadora (sendo dona de casa, etc).
Nessa miscelânea de seres, fui aprendendo, principalmente, a
me impor, pois apesar de haver uma variedade imensa de tipos de mulheres com
quem convivia, cada uma queria que seu ponto de vista fosse o certo a ser
seguido! Desta forma, tinha que saber lidar com a luta de poder entre homens e
mulheres, mas também a luta de poder dentro do mundo feminino (que afirmo com
convicção, não ser menos hostil do que qualquer outro).
Aos poucos, fui criando marra para poder mostrar o que eu
era, para segurar a onda de ser diferente delas, mesmo havendo coincidências.
Para todas, o lado em que havia choque era sempre mais aparente do que o lado
em que coincidíamos. Por isso, não fazia tanta diferença se eu estudava o
dificílimo Lacan, pois depois eu me maquiava e me enchia de brilho para dançar,
e isso era muita futilidade. E nem tampouco importava se eu era uma super mãe
extremamente amorosa e dedicada, se depois eu dialogava com o meu marido ou com
meu chefe de igual pra igual, e sustentava as minhas idéias com tanta firmeza
quanto eles, “como se quisesse ser homem”.
Todas essas mulheres estavam insatisfeitas com a Raquel,
pelo menos em parte. E ser firme sobre quem você é, diante de pessoas que você
ama, é muito mais difícil do que ser firme no trabalho no meio de um monte de
homens (alguns extremamente machistas). Foi preciso ser muito macho pra poder
enfrentar essa mulherada, sempre exigindo mais e mais. E sempre colocando
(sutilmente) o amor delas por mim na berlinda. Foi preciso ser firme e não ter
medo de arriscar esse suposto amor para poder ser quem eu queria ser e quem eu
era!
Lacan fala, em um de seu textos, que “se procure a mulher”, ou
seja, é preciso saber para que mulher esta pessoa está endereçando o seu olhar,
para entendermos melhor esta pessoa. É preciso estarmos atentas sobre o olhar
que endereçamos a esta mulher, para que quando este olhar recair sobre nós,
possamos nos manter firmes sobre o que somos, o que queremos ser e o que
podemos ser. E assim, não nos violentarmos na incessante tentativa de
atender à demanda desta outra.
Quando vi a foto da duquesa achei sensacional a barriga de
pós-parto aparente, que ia na contra mão de todas as fotos de celebridades que
escondem com cintas absurdas suas barrigas de mãe.
Por que ser mulher tem que significar ser mãe, tem que
significar ser linda, bem sucedida profissionalmente e amorosamente? Quem disse
isso? Para quem as mulheres do mundo estão endereçando seus olhares quando
abrem suas bocas e dizem “Nossa, você viu como a Angelina Jolie está linda, bem
casada, mais rica do que nunca? E acabou de ter bebê!”... Existe um imperativo
sobre o que é ser feliz no mundo hoje, e sobre isso também é preciso se pensar!
É preciso se pensar sobre isso, e TAMBÉM sobre o porquê de tantas pessoas
(homens e mulheres) se renderem totalmente a esses imperativos de felicidade.
Será que é porque é muito mais fácil se render do que bater o pé e ser firme
sobre quem se é de verdade? Será que é porque dói muito ser hostilizado pelo
outro quando não se responde a uma demanda de amor que exige ser magra, rica,
inteligente, bem casada e por aí vai...?
A força de uma pessoa está diretamente ligada a sua
capacidade de lidar com o que é diferente de si. Saber conviver e respeitar o
outro com as suas diferenças de pensamento, de etnia, de classe social, etc.
Isso é, obviamente, um treino diário... Pois assim como
temos que ter essa força interior para lidar com o outro que é diferente de
nós, temos que, antes disso, termos tido força para suportar as discrepâncias
que habitam em nós mesmos, ou seja, a discrepância e, às vezes, abismos que
existem entre a pessoa que sou, a pessoa que eu quero ser e a pessoa que eu
posso ser... Diariamente lidamos com estas três instâncias que, para alguns,
são amigas e dialogam entre si (mesmo com suas diferenças), mas que para outros
são irreconciliáveis...
Essa “irreconciliação” é que nos torna tão intolerantes com
os outros, pois se não soubemos dialogar com as diferenças que habitam em nós
mesmos, como podemos dialogar com as diferenças que habitam fora de nós? É uma
tarefa impossível. Assim como a tarefa de agradar a todos que exigem que
sejamos uma pessoa perfeita.
Por tudo isso, achei incrível a audácia da duquesa que
assumiu (perante todos os que absurdamente a exigiam uma perfeição inatingível) ser uma
mulher naturalmente bela, que vive sua maternidade exatamente com o que ela
trás, incluindo a barriga pós parto!
Ser bela não significa responder à demanda
de amor do mundo fantasioso das mulheres perfeitas. Não! Longe disso! Ser bela
é estar em sintonia com sua própria existência e tudo o que ela trás consigo!
Ser bela é ter respeito por si, antes de qualquer coisa! É respeitar seus
desejos e seus limites! Só assim podemos olhar para nós mesmas e, neste
encontro ou desencontro, ver, fazer e ser beleza!
Que a partir desta audácia, possamos parar para refletir
sobre o quanto cedemos aos imperativos do mundo, e o que disso tudo realmente faz
parte do seu desejo, e não do desejo do outro.
Sejamos corajosas, minhas queridas Bellyssimas, para sermos
belas a partir do que realmente somos, com todas as nossas limitações (de
corpo, de inteligência, de grana, de presença de espírito, etc...).
Um beijo grande na barriga de cada uma de vocês!!!!
Raquel, adorei o texto, de verdade. faz muito sentido, alem de extremamente bem escrito. penso que nos falta uma certa dose de autenticidade e auto conhecimento, para nos assumirmos e nos gostarmos como queremos ser, e nao como os outros querem que sejamos. parabens pelo blog! beijos!!!!
ResponderExcluirÉ isso mesmo, Bruninha!!! Mas, mais do que autenticidade é preciso coragem e força para persistir aos sopapos que corremos o risco de levar por sermos verdadeiras!!!!
ResponderExcluirObrigada por ter gostado do texto! Foi feito cheio de amor e verdade!!!
Beijos!!!
mi vejo demais nestas lutas, por ser fora dos padrões desde criança e ser de cabeça erguida.
ResponderExcluirGratidão por tudo isto, veio na hora certa!
Gratidão, querida Bia! Por compartilhar os sentimentos e por ter nos proporcionado uma manhã tão linda com as mamães slingueiras e dançarinas!!! Foi mágico!!!! Beijos!!!!
ResponderExcluirAdorei o texto. Honestidade é algo a ser reconquistado. Texto, inclusive, uito honesto. Beijo.
ResponderExcluirQuando a gente fala com o coração tem que ser honesto, Aysha lindona!!! É uma honra tê-la aqui no Belly Mama!!! Beijos e seja bem-vinda!!! =)
ResponderExcluirGostei muito do texto, ótimo. Acredito que viver na superficialidade do SER e da VIDA é viver na ilusão!!! Devemos nos aprofundar e sentir a nossa essência, descobrir a nossa beleza e saber o grande potencial que temos. Viver honestamente e consciente. Beijos, minha querida!!!
ResponderExcluirLeid, acredito que estamos nesse caminho... Que para ser trilhado a vida toda, sempre mantendo a atenção sobre nós mesmas!
ResponderExcluirBeijos, amiga!
E eu ouvi tanto comentário machista falando do "absurdo" da aparição com aquela barriga imensa...Vindo de pessoas que obviamente não tem a menor noção da dimensão do significado de tal atitude. Espera-se das mulheres, simplesmente. Espera-se o que é esperado, ditado, obrigatório...que enfiem suas barrigas em cintas, que escondam o que não agrada os olhos...Pêlos, peitos caídos, barriga flácida, cutículas, suor, gritos.
ResponderExcluirParabéns pela reflexão querida!
um beijo
Elbinha, isso tudo, e muito mais, sempre é esperado pelas pessoas de um modo geral... Que continuem esperando... Sentados! Pois o fato crucial não é ser cuidadosa consigo mesma, é a exigência de que se ultrapasse um cuidado e se chegue ao ponto de submeter-se à atrocidades contra o próprio corpo e cotra a própria existência, para se atingir um padrão de beleza impossível!
ResponderExcluirQue as mulheres se cuidem, sim! Que cuidem de seus corpos, de suas mentes, de suas vidas integralmente! Mas tudo de acordo com o tempo de cada uma, de acordo com a experiência que se está vivendo, se respeitando sempre!